*Por Francisco Praciano – Que coisa: a gente vai ficando velho e a saudade de tudo nos persegue. Égua!
Falando do Armando me lembrei do Carril. Lembrando do Carril me lembrei da conta impagável que ele mantinha no Armando. O Armando não encerrava a conta com medo de o Carril desaparecer e a conta ia tomando proporções policiais.
O outro motivo da continuidade dessa relação negocial era que o Armando adorava o Carril e sabia das condições falimentares do eterno jovem estudante Carril, nosso Peter Pan.
Falando em Armando, me lembrei de meio mundo de Manaus. Deco , Cinco Estrela, Montanha, Palheta, Américo Madrugada, Emerci, Manel Batera e uma cambada de biqueiros, esquerdistas, comunistas e outros cachaceiros que se apresentavam como tal. É muita gente.
Quem não viveu o Armando não conhece a alma de Manaus.
O Armando era um encontro de almas boas.
Para frequentá-lo precisava-se ser ou parecer um pouco poeta, um pouco político, um pouco intelectual, qualquer coisa de artista , um pouco malandro, um pouco alternativo ou rebelde…Era preciso ter vícios e virtudes não muito
encontrados na elite.
Frequentar o bar era, também, um vicio. Era, também, e principalmente, uma vitrine e uma oportunidade de ter um palanque, uma tribuna, de ouvir e ser ouvido. Ambiente democrático.
Pra quem desconhece, na época da ditadura lembro que o bar serviu de bunker para os subversivos com as graças do amigo Armando e de São Sebastião.
A frequência era de certa forma uma obrigatoriedade para garantir o status prestigioso de ser frequentador daquela irmandade. Dava status, prestígio.
Houve tempos em que, ouvindo-os ou não, se dizer admirador de Chico, Milton, Caetano , Gil e Vinícius garantia um certo prestígio de intelectual e até de revolucionário junto aos mais desatentos.
Frequentar o Armando, também, garantia algo semelhante, principalmente se o frequentador se apresentasse com uma camisa do Che, Mao, Neruda, Lula Mandela ou tivesse lido, pelo menos, a orelha de alguns livros progressistas.
Lembro-me bem da vaidade que tinha de me dizer frequentador do Armando. Era uma forma que encontrava para me mostrar como de esquerda, como um pouco rebelde e revolucionário. Pode ser risível, mas é verdadeiro. Era um sonho, um bom sonho. Cheguei novo em Manaus e o Armando participou, sim, da minha formação e da minha cidadania amazonense e manauara.
Para quem não sabe ou não lembra, fui o autor da concessão do Título de Cidadão Manauara ao Armando. Tenho orgulho disso. Considero o Bar do Armando e A BICA patrimônios imateriais da Cidade de Manaus.
*Francisco Praciano – Ex-vereador de Manaus por quatro mandatos e deputado Federal (PT).
(Uma homenagem post mortem ao companheiro Armando)