Um grupo de residentes de Roraima, que por motivos de segurança decidiram não ser identificados, acusam Jair Bolsonaro (PL), o governador de Roraima, Antonio Denarium (PP) e o então ministro da Justiça e atual senador Sergio Moro (União Brasil) de terem promovido um genocídio contra os ianomâmis.
Eles lembram que Moro apresentou o Projeto de Lei 191/2020 que regulamentou a exploração de ouro em terras indígenas, permitindo que Bolsonaro apresentasse propostas de exploração mineral, ignorando as audiências e negativas dos povos indígenas sobre a exploração. O inciso II, artigo 14º, capítulo V do PL aponta que:
“O pedido de autorização poderá ser encaminhado com manifestação contrária das comunidades indígenas afetadas, desde que motivado”.
A introdução da parte “desde que motivado” permitiu que o governo facilitasse a exploração em terras indígenas, o que, segundo os denunciantes, é inconstitucional. Ainda, o aumento de madeireiros e garimpeiros no Território Indígena Ianomâmi teria aumentado a disseminação de doenças decorrente de efeitos das intervenções predatórias.
A utilização de mercúrio na prospecção de ouro nos garimpos clandestinos tem sido responsável pela contaminação dos rios e por consequência da principal fonte de alimentação dos ianomâmis, provocando desnutrição profunda, doenças cardíacas e mortes. O desmatamento, por sua vez, contribuiu para a condição de vulnerabilidade dos indígenas, que deixaram de ter na floresta amazônica a fonte secundária de sua alimentação — com a redução da disponibilidade de caça e o comprometimento da lavoura de subsistência.
Segundo a notícia-crime encaminhada ao procurador-geral da República (PGR) Augusto Aras, o governador de Roraima, Antonio Denarium, assim como o senador Mecias de Jesus (Republicanos) e outros legisladores do estado, teriam sido cúmplices do projeto de Moro e Bolsonaro. Os noticiantes pedem uma investigação isenta e rigorosa pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, em relação ao crime de genocídio.
Os atos de genocídio tipificados no Estatuto de Roma do TPI e, também, na Lei Penal Brasileira, vão além de condutas que caracterizam agressões que levem ao resultado da morte. O estatuto do TPI afirma, em seu Artigo 6º, que é caracterizada como genocídio a prática de “sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua destruição física, total ou parcial”.
“Trata-se de uma forma de genocídio que faz referência à destruição de um grupo por meio de uma ‘morte lenta’ e, dentre os métodos utilizados, podem ser mencionados a privação de nutrientes (comida e água) aos seus membros, a sistemática expulsão de suas casas e a redução dos serviços médicos essenciais abaixo da condição mínima de vida, bem como, submetê-los a um trabalho excessivo ou a um esforço físico extenuante”, dizem os noticiantes, em um comunicado enviado ao Brasil 247.
O comunicado denuncia que “o cenário de desnutrição endêmica e de abandono nas ações de atenção de saúde hoje conhecidas, revela com clareza um método que se emprega para aniquilar fisicamente o Povo Yanomami e permitir, com seu potencial destrutivo da etnia, a ocupação da área pelo garimpo ilegal e predatório”. Segundo os noticiantes, o genocídio dos ianomâmis em Roraima sempre foi “um projeto político que visa à apropriação das riquezas da reserva indígena por meio da estratégia de utilização do genocídio como forma de ocupação do território por garimpeiros e madeireiros ilegais”.
Os agentes do ‘genocídio’
De acordo com eles, o ex-ministro Moro foi “a mente jurídica por trás do genocídio, sendo dele a autoria dos projetos de lei federais que visavam autorizar o garimpo em reservas indígenas”, enquanto Bolsonaro “a todo momento declarava serem os Povos Originários um ‘entrave ao desenvolvimento de Roraima’”.
No que lhe concerne, o senador Mecias de Jesus, que lidera o grupo político que atua em Roraima, “agiu como escudo do braço operacional do IBAMA e da FUNAI, desmobilizando as forças fiscalizatórias desses órgãos e sendo o articulista da omissão das políticas de saúde indígena totalmente abandonadas pelo DSEI-Y [Distrito Sanitário Especial Indígena — Yanomami], órgão controlado pelo senador”.
O governador Denarium teria providenciado os meios legais e físicos para a ocupação das terras indígenas pelos garimpeiros, “tendo apresentado projetos de lei de sua autoria para permitir o uso de mercúrio no garimpo e também evitar a ação da fiscalização”.
“Em 08/02/2021 foi sancionada e publicada a Lei Estadual nº 1.453/202121, de iniciativa do Governador Antonio Denarium, que autorizava o uso de mercúrio na lavra de ouro, além de simplificar todo processo de licenciamento ambiental, impulsionando de forma assustadora a ocupação da área indígena pelos garimpeiros”, denuncia a notícia-crime.
“Por outro lado, para permitir o projeto de negligenciamento progressivo da fiscalização do garimpo ilegal, a Assembleia aprovou outra lei também de iniciativa do Governador Antonio Denarium, a Lei Estadual nº 1.701/202223, que, de forma absurda, buscava proibir a fiscalização contra o garimpo”, destaca.
Ainda, o agora ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) e então deputado federal Jhonatan de Jesus, filho de Mecias, “agia diretamente no comando do DSEI-Y providenciando para que as ações de saúde indígena não fossem implementadas”, segundo o comunicado; e o vereador Ítalo Otávio, de Boa Vista (RR), propôs uma lei municipal (confira abaixo) para evitar que fossem atendidos no hospital da capital não residentes no município, deixando os indígenas excluídos do único hospital de referência no estado de Roraima.