
O jornal The Guardian, um dos maiores da Inglaterra, publicou um artigo sobre as acusações contra Jair Bolsonaro e a resposta da democracia brasileira. O título: “Brasileiros celebram força da democracia enquanto Bolsonaro é denunciado”. Leia:
Os democratas brasileiros comemoraram a força do Judiciário e das instituições do país depois que o ex-presidente Jair Bolsonaro ficou diante da possibilidade de ostracismo político e prisão por supostamente planejar um golpe. A situação contrasta fortemente com o fracasso dos EUA em responsabilizar Donald Trump por seus atos antidemocráticos.
“No Brasil, golpistas vão para a cadeia. Nos EUA, eles voltam para a Casa Branca”, afirmou Marcelo Freixo, político de esquerda, nesta quarta-feira, após o procurador-geral da República acusar formalmente Bolsonaro de arquitetar uma conspiração para se manter no poder depois de sua derrota na eleição de 2022.
Por seus supostos crimes – que incluem participação em uma tentativa de golpe de Estado, associação criminosa armada e tentativa violenta de abolir o Estado de Direito – Bolsonaro pode enfrentar uma pena de mais de 40 anos de prisão. Enquanto isso, Trump inicia seu segundo mandato presidencial após escapar de responsabilização por suas supostas infrações, incluindo o incentivo ao ataque ao Capitólio em janeiro de 2021.
Freixo não foi o único a expressar esse sentimento enquanto os brasileiros absorviam os detalhes chocantes da denúncia de 272 páginas apresentada pelo procurador-geral, que revelou o quão perto uma das maiores democracias do mundo esteve de sofrer uma ruptura militar violenta após a derrota de Bolsonaro para Luiz Inácio Lula da Silva em 2022.
Desesperado para se manter no poder, Bolsonaro teria comandado uma complexa conspiração autoritária ao longo de dois anos, utilizando redes sociais para disseminar desinformação contra o Supremo Tribunal Federal e o sistema eleitoral, incentivando o caos nas ruas e usando essa instabilidade como pretexto para uma intervenção militar.
O elemento mais sinistro do suposto plano envolvia a “neutralização” de figuras públicas consideradas inimigas do bolsonarismo, com o uso de armas e veneno. Entre os alvos estavam o ministro do Supremo Alexandre de Moraes e o próprio presidente Lula.
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O ex-presidente rejeitou as acusações do procurador-geral. Seus advogados expressaram “espanto e indignação”, e seu filho Carlos Bolsonaro comparou a denúncia a um “saco de estrume”.
Em um comunicado, Bolsonaro afirmou que o sistema de justiça brasileiro foi “armado” contra ele numa tentativa de criminalizar seu movimento e silenciar milhões de apoiadores. “Essa é a mesma estratégia fracassada usada contra o presidente Trump”, disse ele, referindo-se ao seu principal aliado internacional.
Mas para os setores progressistas do Brasil, o país está demonstrando que, ao contrário dos EUA, suas instituições estão conseguindo responsabilizar aqueles que atentaram contra sua jovem democracia.
O advogado Augusto de Arruda Botelho, ex-secretário nacional de Justiça, classificou o momento como histórico. “Para qualquer pessoa que se considere democrata, este é um momento histórico no Brasil. Este é o momento em que dizemos: ‘Há limites’.”
“Divergências políticas, ideológicas e partidárias são saudáveis em qualquer democracia. Mas há limites. E Bolsonaro e o bolsonarismo foram muito além desse limite”, acrescentou Botelho. “O limite é a lei. Eles quebraram a lei ao tentar dar um golpe e agora estão sendo processados por isso.”
O professor de direito constitucional da USP, Conrado Hübner Mendes, afirmou que há “mais do que provas suficientes” para que Bolsonaro seja condenado. Para ele, uma eventual condenação criminal, somada ao fato de que Bolsonaro já está inelegível até 2030, “deveria encerrar sua carreira política”.