*Por Francisco Praciano – Algumas homenagens, que vi e ouvi, por ocasião do aniversário de Manaus, deram ênfase aos aspectos materiais e históricos da cidade: Teatro, pontes, monumentos e prédios históricos, diga-se de passagem, que escaparam da incúria das elites locais, da voracidade da Zona Franca, das autoridades e instituições curadoras da cidade.
Sem referências ao Teatro Amazonas, a Ponte dos Ingleses e ao Mercado Adolpho
Lisboa parece que a homenagem é pobre e não voga.
Citá-los me parece clichê ou pabulagem para demonstração de conhecimento da história de Manaus. Pelo contrário, acho que não conhece a história da cidade quem não conhece também a estória da sua desconstrução.
Estranho é que as homenagens centradas nos prédios históricos e na arquitetura urbana esquecem de “desomenagear” o sumiço do Cine Guarany e do desaparecimento quase total da arquitetura clássica, das casas e prédios do Centro histórico. Essas homenagens não têm fôlego, pois não passam de dez as citações.
Se quisermos estender as referências temos que incluir ruínas ou citar defuntos prédios da desfigurada Manaus.
Só conseguimos citar algo como que dez referências históricas? Cadê a cidade que estamos homenageando? Quanto aos Igarapés, Tarumãs e pontes da Bolívia nenhuma homenagem vi a eles se referindo, porquanto todos viraram Tietê, todos estão moribundos. Cadê a cidade que estamos homenageando?
Desapareceu, está só na nossa memoria e historiografia da cidade.
Sem sentir, criamos uma cidade de dez prédios pra homenagear. Essa não é a cidade real.
A homenagem à cidade real deve incluir os minguados prédios históricos , mas também o morno, cinza e sem graça Polo Industrial, a Zona Leste criada pela Zona Franca e os sofridos e maltratados cidadãos e sub-cidadãos que habitam a nossa real cidade de Manaus.
E quem tem coragem de homenagear essa cidade real? A falta de saneamento, o Sistema de Saúde, Educação e Transporte?
As homenagens viram abstrações, palavras ao vento.
É mais fácil e simpático para fazer política.
Nunca vi em festa de aniversario, se tratar das “desvirtudes” do aniversariante. Inaugurei essa prática agora pra criar consciência crítica e motivar lutas pela melhoria da cidade real que eu escolhi pra ser minha.
Cheguei em Manaus em Janeiro de 1973. Conheci ainda uma cidade bucólica. Nenhuma novidade, pois só era um nordestino a mais, um arigó, um arataca chegando. Mais um cara de fora.
A novidade foi o meu espanto e admiração pela hospitalidade do Manauara. Mais do que isso, a solidariedade, a fraternidade do amazonense. Pessoas sem medo, sem discriminação, que acolhiam os de fora. Achei interessante ser bem recebido como cearense e nordestino, quando o Sul, Sudeste e outras regiões nos temiam, nos exploravam e discriminavam.
Não conhecia a História. A maioria era como eu: filho, neto ou bisneto de cearenses e nordestinos.
Logo, logo estava dormindo, comendo e convivendo com pessoas quase estranhas e conhecidas na semana ou no dia
anterior.
Não demorou, estava na cozinha dos manauaras comendo Jaraqui e recebendo muita atenção, respeito e carinho. Que povo bom!
Essa recepção era com todos. Pobres e ricos, negros e brancos, sulistas ou nordestinos.
Que povo bom! Que coração ecumênico! Amor à primeira vista. Paixão.
Minha homenagem não tem prédios.
Homenageio algo que a má politica e a ganancia ainda não destruíram.
Homenageio, não a cidade, mas o povo bom manauara que, ao se conscientizar do poder que tem, salvará essa cidade.
*FRANCISCO PRACIANO
Ex-Dep.Federal -PT/AM