O empresário bolsonarista Luciano Hang, dono das lojas Havan, manteve por 17 anos uma empresa num paraíso fiscal, mas não informou às autoridades que tinha dinheiro no exterior, como determina a lei.
Criada em 1999 nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal no Caribe, a offshore só foi regularizada em 2016. Foi o que apontaram documentos no projeto Pandora Papers, do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, na sigla em inglês). Dois anos após ser regularizada, a empresa de Hang, chamada Abigail Worldwide, tinha em conta US$ 112,6 milhões – R$ 604 milhões na cotação atual do dólar. A informação foi publicada pelo site Poder 360.
O valor da conta apareceu em um documento do banco suíço EFG Bank encaminhado ao empresário em 16 de outubro de 2018. Apesar de Hang ter legalizado a offshore perante a Receita Federal em 2016, o empresário apresentou a Abigail ao mercado brasileiro somente em agosto de 2020, quando a Havan lançou um plano para colocar ações na Bolsa de Valores. No documento apresentado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), uma menção à offshore constava da página 336. Dizia que a Havan havia incorporado 100% da empresa. O projeto de lançar ações na Bolsa foi engavetado, sem explicações.
Para regularizar o dinheiro que estava fora do Brasil, Hang pagou 15% de imposto sobre o valor que tinha no exterior e uma multa de 100% sobre o tributo, como determinava uma lei aprovada em 2016 no Brasil. O dinheiro do empresário foi legalizado, mas continua depositado na Suíça. A lei não obrigava o dono dos recursos a trazer o dinheiro para o Brasil.
Só podem ser regularizados recursos de origem lícita, mas autoridades brasileiras não fazem a checagem. Basta o dono da offshore dizer que o recurso é legal.
O dono das lojas Havan afirmou ser nacionalista, mas não expressou a mesma convicção ao fazer seus investimentos. Na conta que mantém no EFG Bank em Zurique, na Suíça, predominam os investimentos em companhias norte-americanas ou europeias, de acordo com o documento de 2018 do banco.
Dos US$ 112,6 milhões que tem na Suíça, US$ 43,4 milhões foram emprestados, mas não se sabe para quem. Dos US$ 69,2 milhões investidos, 97,3% foram aplicados em papéis de empresas dos Estados Unidos como Goodyear, Motorola, AT&T, Verizon e Netflix; da França (Eletricité de France), da Suíça (UBS e Credit Suisse); da Inglaterra (Barclays e Lloyds); da Índia (Jaguar e Land Rover), entre outros.
O empresário disse ver um “claro objetivo da construção de uma narrativa que visa desconsiderar tudo que a Havan investe no Brasil, contribuindo nestes 35 anos com milhares de empregos diretos e indiretos, bilhões em investimentos, pagamentos de impostos etc.”, afirmou em e-mail encaminhado pela sua assessoria.