As conversas entre bandidos costumam ser permeadas por gírias, usadas com o intuito de tornar o diálogo ininteligível para pessoas de fora. O linguajar marginal também migra para a escrita, na qual termos são alternados com frequência, também para dificultar o entendimento das pessoas que estão fora do universo criminoso, principalmente a polícia.
A Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes (Dise) de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, teve acesso a uma infinidade de trocas de mensagens, em texto e áudio, nas quais membros do Primeiro Comando da Capital (PCC) realizam negócios e trocam informações sobre planos de infiltração na política. Para isso, usam e abusam das gírias, incluindo personagens do universo infantil, em contextos distorcidos.
“Chamou a atenção [da polícia] um diálogo em especial […] quando Fabiana diz: ‘eu vou mandar um recado lá para o Turma da Mônica’, é uma forma de se referir a Marco Willians Herbas Camacho – o Marcola – e seus aliados”, diz trecho de relatório, obtido pela reportagem.
A mulher mencionada é Fabiana Lopes Manzini, presa em setembro do ano passado por tráfico de drogas. Na ocasião, dois celulares foram apreendidos com ela, nos quais a Dise descobriu o diálogo entre lideranças da facção paulista. Descobriu-se também que ela é casada com Anderson Manzino, o Gordo, chefão do PCC. Ele está atrás das grades desde 2002.
Isso, porém, não o impediu de dar continuidade aos seus negócios criminosos, como mostra investigação da Polícia Civil.
Como o Metrópoles mostrou, Gordo é apontado pela Polícia Civil paulista como o braço direito de Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho, que ao lado de Marcola e outros integrantes da cúpula da facção profissionalizou o tráfico de drogas, transformando o PCC na maior organização criminosa do Brasil, com ramificações em mais de 20 países.
Preso por roubo a banco, homicídio e extorsão mediante sequestro, ele seguiu se comunicando por meio de cartas, vazadas para fora da cadeia.
Nos manuscritos, ele começou a acionar membros da cúpula, para garantir a própria vida, logo após ocorrer um racha histórico entre Marcola com os criminosos que fundaram a dinâmica empresarial do crime. Entre os agora rivais do líder máximo está Andinho, padrinho no crime de Gordo.
Em desespero, Gordo escreveu cartas para Décio Gouveia Luís, o Português, apontado como “herdeiro” de Marcola. Após a Polícia Civil decifrar que “Turma da Mônica” era uma referência à célula do líder máximo, descobriu-se que o braço direito de Andinho também teria tentado pedir clemência ao homem que lhe decretou a sentença de morte.
Algumas decisões e atitudes de Marcola desagradaram seus antigos aliados, provocando uma guerra interna entre os chefões da cúpula, a quarta em 30 anos de existência do PCC, e a primeira que ameaça o posto do ainda líder máximo.
Ele, para se resguardar, então decretou a morte de Andinho, Roberto Soriano, o Tiriça, e Abel Pacheco de Andrade, o Vida Loka — que cumprem pena em presídios federais.