
Jair Bolsonaro contesta as acusações da Procuradoria Geral da República e alega ter sido vítima da chamada “fishing expedition” (pesca probatória) durante a investigação da Polícia Federal.
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou na última quinta-feira (6/3) sua defesa na denúncia pela trama golpista em que contesta as acusações da Procuradoria Geral da República (PGR) e alega ter sido vítima da chamada “fishing expedition” (pesca probatória) durante a investigação da Polícia Federal.
A pesca probatória, na tradução em português, consiste na investigação com fins especulativos em que não se tem um alvo pré-definido nem uma causa provável. Na prática, é como se os investigadores jogassem uma “rede” na esperança de “pescar” algum fato novo.
Algumas das práticas de fishing expedition, segundo o advogado criminalista Renato Losinskas Hachul, são, por exemplo, a expedição de mandados de busca e apreensão genéricos, vasculhamento aleatório de conteúdos de celulares e computadores, interceptações telefônicas por longos períodos ou a quebra de sigilo bancário, fiscal e de dados ampla e sem causa previamente justificada.
Ele afirma, no entanto, que a comprovação do uso da técnica em investigações pode ser dificultada, inclusive, pela conduta dos agentes de investigação, que podem “buscar dar ares de legalidade às práticas investigatórias”.
A opinião é compartilhada pelo advogado criminalista Conrado Gontijo, para quem há um “campo de subjetividade” na análise.
“Não existe um critério matemático ou fixo para dizer se há ‘fishing expedition’ ou não. O conceito é que se eu, de alguma forma, perco o foco e começo a buscar coisas aleatórias, começo a fazer tentativas que sinalizam que eu já não estou procurando um fato específico, mas eu estou tentando procurar alguma coisa qualquer para tentar aproveitar a investigação, eu teria aí uma hipótese de fishing expedition”, afirma.
O advogado, no entanto, aponta para a diferença entre a prática ilegal e o chamado “encontro fortuito” de provas, ou “serendipidade”. Diferentemente da fishing expedition, esse encontro de novas provas é permitido e ocorre quando, por acaso, novos fatos sobre a investigação surgem no curso da apuração.
Gontijo cita como exemplo o cenário hipotético de agentes que cumprem um mandado de busca e apreensão contra um suspeito de corrupção.
“Imagine uma busca e apreensão na casa de alguém que está sendo investigado por ter corrompido um funcionário público “A”. E aí, durante a busca e apreensão, você pega uma planilha que contém a relação de pagamento para um funcionário público “B”. Você descobriu um fato novo ali. Essa é uma hipótese de encontro fortuito de provas”, afirma.
Apesar da subjetividade no entendimento do que é ou não uma pesca probatória, o advogado Renato Hachul explica que, em caso de comprovada a prática, as provas obtidas por meio da pesca probatória podem ser anuladas.
“Reconhecida a prática do fishing expedition, as provas obtidas por tal método são consideradas nulas e devem ser desentranhadas do processo. Também serão nulas as provas e atos delas derivadas”, afirmou.
Segundo ele, há casos em que é possível que tal nulidade atinja todo o processo. “Se houver uma ação penal por tráfico de drogas decorrente de busca domiciliar que venha a ser considerada ilícita, a nulidade dessa prova anula todo o processo, pois ela é o pilar da acusação”, disse à coluna.
Tal nulidade, inclusive, é baseada em jurisprudências de tribunais superiores, que já barraram o uso da pesca probatória.
Hachul cita, por exemplo, acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de um recurso de Habeas Corpus que entendeu ser ilegal a busca pessoal sem fundada suspeita descrita de modo objetivo e justificada por indícios de que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou outros objetos ilícitos, evidenciando-se a urgência para a diligência.