Em meio a um escândalo na Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a Procuradoria-Geral da República (PGR) revelou suspeitas de corrupção envolvendo Alexandre Ramagem (PL), diretor da agência durante o governo Bolsonaro e potencial candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro. As acusações giram em torno da suposta corrupção para evitar a divulgação de informações sobre o uso irregular do software espião FirstMile durante sua gestão.
A Operação Última Milha, deflagrada em 20 de outubro, prendeu oficiais da Abin e afastou servidores sob suspeita de participação na compra e uso do FirstMile, capaz de monitorar a geolocalização de aparelhos celulares. Amigo pessoal da família Bolsonaro, Ramagem não foi alvo da ação, mas é citado no inquérito.
Segundo a PGR, Eduardo Izycki e Rodrigo Colli, servidores da Abin presos na operação, “cientes do uso indevido do sistema FirstMile”, coagiram Ramagem a retardar o julgamento de um processo disciplinar interno. A PGR aponta indícios de concussão e corrupção contra Izycki e Colli, e corrupção passiva por parte de Ramagem.
“Há indícios de prática de concussão e de corrupção ativa de Eduardo Izycki e Rodrigo Colli e de corrupção passiva pelo ex-diretor-geral da Abin Alexandre Ramagem”, disse a PGR.
A dupla era investigada por uma suposta fraude licitatória no Exército e teria utilizado o conhecimento sobre o uso do software espião para evitar demissão. O uso do FirstMile veio à tona após a revelação de uma fraude licitatória no Exército, envolvendo servidores da Abin.
Em resposta, Ramagem afirmou que “representou na Polícia Federal” para obter informações sobre as questões abordadas na reportagem. A PF sustenta que Ramagem, como parte do “núcleo da alta gestão” da Abin, está entre os responsáveis pelas irregularidades no uso do software.
A investigação apura as irregularidades desde a compra, em 2018, no governo de Michel Temer, até as tentativas de evitar a apuração interna, resultando no monitoramento indevido de diversas pessoas entre 2019 e 2021. A PF alega que houve “apropriação indevida da Abin por parte dos altos gestores” para fins ilícitos.
“A potencial ciência e participação dos então responsáveis pela gestão da Abin ganha relevo quando, em ação extemporânea após o esgotamento do uso da ferramenta, constroem processo administrativo ‘correicional’ para garantir a ‘legalidade a posteriori’ de sua ações”, diz a investigação da PF.
O software, adquirido por R$ 5 milhões, foi utilizado para ataques sistemáticos à rede de telefonia nacional, comercializando dados pessoais sensíveis e disponibilizando geolocalização de cidadãos brasileiros sem ordem jurídica. A PF cita professores, advogados, políticos e outros como alvos.
A Abin afirmou que deixou de usar a ferramenta em maio de 2021 e colabora com as investigações. A PF decidiu investigar o Exército após a revelação de que a instituição havia adquirido o sistema.